Soube sobre a acusação de estupro que Neymar sofreu a semana passada aos poucos. À medida que ia me inteirando do assunto fui notando como as pessoas e eu mesma, víamos o caso. Interessante perceber, em primeiro lugar, qual o julgamento feito sobre o comportamento feminino e o masculino, em relação a um encontro casual, com sexo envolvido.
Em segundo lugar, minha reflexão me levou para notar como estamos colocando nossa vida em risco. Não sabemos ao certo o que aconteceu no caso Najila e Neymar. E não pretendo fazer uma avaliação de quem pode estar mentindo neste caso. Gostaria de levar minha reflexão para o comportamento do sexo casual. O sexo casual existe há séculos. Só que, provavelmente hoje, ele seja mais popularmente aceito, e visto com uma certa normalidade. Ao se tornar normal, mais homens e mulheres estão, querendo ou não, colocando em risco suas vidas.
Vamos ser honestos: encontros casuais que envolvem sexo acontecem todo dia, em todo lugar. Muitos desses encontros são entre pessoas que mal se conhecem. Pode-se justificar dizendo que a pessoa é “amiga de conhecidos” – como se isso fosse garantia de alguma coisa. Pode-se justificar que “ficaram semanas trocando mensagens”. Pode-se justificar que o lugar era de gente de bom nível (todas são frases que escuto nas minhas entrevistas). O fato é que, cada vez mais, o sexo casual acontece com quase ou total desconhecidos. Ficar só com um desconhecido entre quatro paredes, é um risco. Sempre foi e, talvez hoje em dia, com a violência propagada, mais ainda.
Talvez seja a solidão. Talvez seja um pouco de inocência por acreditar que desses encontros o amor da vida irá surgir – e deixo claro, que acredito que isso pode ser possível. Qualquer ponto de encontro pode gerar oportunidade, embora as probabilidades sejam baixas. Porém, com tantos anos pesquisando pessoas e seus relacionamentos, estou convencida que uma relação saudável – que é o sonho da maioria – acontece com o entendimento, conhecimento e aceitação sobre quem é a pessoa com a qual iremos nos relacionar. E isso leva tempo.
Devo deixar claro que não sou contra o sexo casual. Nem a favor. Meu ponto é, será que não estamos perdendo a noção dos riscos que estamos correndo? Se o encontro foi só por prazer, e viver no risco, faz parte desse prazer, então está tudo certo. O relevante, acredito, é a consciência dos atos e suas consequências.
Voltando ao caso da modelo e Neymar, ao ler sobre a entrevista que ela deu para o SBT, vi que ela não quis ir adiante na relação sexual quando soube que não havia preservativo disponível. Ouvi comentários ironizando essa fala, como se ela não tivesse o direito de parar quando quiser. Temos que entender que qualquer um pode parar no momento que assim o desejar. Não importa o que foi concedido até aquele momento. Evidente que seria ideal parar antes, bem antes. Porém, mesmo tardio, o direito de dizer não pertence aos dois. Pode-se ficar bravo e chateado quando isso acontece. Mesmo assim, respeitar esse direito é uma obrigação.
Agora, se for verdade que o ponto de discussão entre ambos foi a falta de preservativo, me pergunto, se tanto homens como mulheres, aceitam viver relacionamentos sexuais casuais, por que o uso de preservativo não é visto também com normalidade? Por que mulheres e homens não o carregam para encontros dessa natureza? E aqui não tem nada de careta – espero – mas de racionalidade: o preservativo além de evitar uma gravidez indesejada, evita doenças sexualmente transmissíveis. Doenças, que podemos supor, estejam mais susceptíveis a ser transmitidas entre pessoas que realizam encontros sexuais casuais com frequência. Até onde vai nossa modernidade e cabeça aberta, que nos libera para o sexo livre, e nos impede de usar proteção? Tanto homens como mulheres que buscam encontros sexuais casuais deveriam, por segurança, andar com preservativos. Isso para mim é moderno e cabeça aberta.
Lembro que há quase duas décadas, quando fiz pesquisas para campanhas publicitárias do Ministério da Saúde, que buscava promover o sexo seguro usando preservativos; ouvi mulheres dizerem que se sentiam livres de ir para cama com quem quisessem – na época isso era disruptivo devido à moral reinante – porém, não queriam levar preservativo na bolsa porque podiam parecer que estavam “sempre prontas e disponíveis”. Essa pretensa imagem de disponibilidade para o sexo feria a moral delas. Transar casualmente com quase desconhecidos, não.
Pois é… quase duas décadas se passaram da pesquisa que realizei. Nesse intervalo de tempo a tecnologia mudou nossa vida. Nossa forma de viver – e com ela, valores e crenças sociais – vem se transformando a passos gigantescos. Mudamos nossa visão de mundo, alteramos nossa forma e objeto de consumo. Parece que tudo ao nosso redor se transformou significativamente. Mesmo assim com tanta modernidade, ainda continuamos com mulheres envergonhadas de carregar camisinha na bolsa e os homens delegando sua proteção à sorte.
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
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