Nossa carreira fala muito de nós. Uma forma comum – e digamos antiga – de avaliar a carreira é medindo o crescimento financeiro que obtivemos, a vida material que construímos através dela. Minha reflexão vai além desse aspecto e convida a pensar o quanto o que conseguimos fazer e construir com nosso lado profissional é uma forma de materializar quem somos e no quê acreditamos. Isto se aplica tanto para quem cresceu consistentemente na sua vida profissional, para quem não conseguiu grandes destaques, ou mesmo, para quem sente que esta é uma área na qual fracassou. Nosso lado profissional, nossa carreira, é uma das nossas obras expostas para o mundo e talvez uma das mais rica em detalhes porque é a obra que traz nós mesmos como resultado.
Como acredito que nós somos o produtos dos valores e das crenças que carregamos pela vida, quanto mais escuto falar hoje em dia, em transição de carreira, mais entendo que está se falando em transição de vida. Antigamente quando se falava em mudar de carreira ou de empresa, o principal motivo era o desejo de crescimento financeiro ou hierárquico. Havia, claro, as exceções, mas o pensamento maioritário era sobre a trajetória de reconhecimento – valorização do eu – pela empresa e pela sociedade. Hoje o motivo que mais ouço, especialmente nos mais jovens e nos profissionais em torno dos 40 anos é o desejo que seu trabalho, sua dedicação, a sua obra, faça sentido num aspecto mais amplo que o próprio eu. Isto significa na busca por um sentido maior para sua existência, uma visão espiritual da sua obra, de seu trabalho. Quando falo em espiritualidade me refiro exclusivamente àquilo que é além do corpo e da matéria, sem nenhum aspecto religioso. A espiritualidade que menciono é nossa conexão com o ambiente, com o outro, é o uso da nossa sensibilidade, percepção e intuição. Ou seja, a conexão com o mundo através de nossa alma.
Estamos na busca de dar sentido à nossa alma. De alimentá-la, expressá-la. Antes expressar a alma através do trabalho era seguir uma carreira artística. Hoje, trabalhar sem expressar esse nosso lado mais profundo e, porque não, mais autêntico, é viver quase que mecanicamente. Quando isso acontece se trabalha quase que exclusivamente para e pelo ego, para e pelo dinheiro. Há muitas pessoas que vivem e valorizam isso. Entretanto, o Movimento Humano de transferência de significado de carreira para além do ganha pão e do exercício de ego, indica claramente, que o modelo de poder (o poder sobre do Movimento Humano Poder Isonômico) está mudando de eixo.
Apesar de sabermos que o dinheiro é fundamental, criamos consciência que ele não é garantia de felicidade. Estamos todos ansiosos em mudar nossas vidas mas não sabemos ao certo como fazer, especialmente aqueles que o querem fazer com o menor prejuízo. Lamento informar que isso será difícil de acontecer. Teremos perdas, necessárias para o ganho futuro. Mudar, nestes tempos de transição de valores sociais significa romper laços e formas, com poucos modelos confirmados a nossa frente. O que pode animar é compreender que continuar igual é continuar num modelo que está a cada dia caducando. Ousadia e coragem se fazem necessários. Inclusive para manter os empregos atuais. Sempre me entristece quando vejo profissionais que pelo medo e insegurança optam em fazer o mesmo, seguir o mesmo caminho, obedecer sem questionar; caminhos que costumam os levar para a tão temida demissão.
O mundo está precisando de coragem. E claro, isso é um risco e uma oportunidade. Mudar de carreira, quando o que queremos é mudar de vida, exige primeiro que assumamos que o desejo não é mudar de empresa, mas de valores que nos rodeiam. E isso envolve todos nossos círculos sociais. Quando é assumido nosso desejo de mudança, o olhar muda, a busca fica mais objetiva. Nesse momento é importante sair da bolha em que se vive, conhecer outras realidades, pessoas que vivem de formas diferentes, ficar por dentro de que está acontecendo além do nosso comumente limitado horizonte. Pode ser que você não goste do que encontre – até porque há um período de adaptação ao novo -, mas saber que existem formas diferentes de viver, de fazer, de pensar, é fundamental nesse momento.
Já escrevi sobre a importância da pausa para o encontro de nós mesmos (leia aqui). Por isso, vai construindo tua nova realidade, vai dando vida ao novo em você, honrando aquilo que te trouxe até aqui, aproveitando tudo aquilo que você armazenou de conhecimento e experiência para que aos poucos, vá se transformado em sabedoria; e quando você menos esperar, a tua transição de carreira terá acontecido.
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
4 Comments
Excelente texto, uma boa reflexão para as transformações que estão ocorrendo
Nany seu texto traz muitas reflexões importantes para mim. Talvez por eu estar passando dos 40 anos e ter o sentimento que preciso fazer uma contribuição maior para o mundo, trazendo um significado maior para a minha existência.
Sem dúvida a "coragem" para mudanças é algo fundamental neste processo!
Tão inspiradora e profunda reflexão me servirá para enriquecer próxima sessão de Coaching sobre o mesmo assunto. Grata
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