Lisboa é uma cidade daquelas que não estava na minha lista de lugares que queria conhecer. Ouvindo tanto falar sobre a “pulsante” cidade e aproveitando uma passagem aérea com preço imperdível, viemos passar uns dias. Descobri uma cidade em reconstrução, no processo de modernização, que me deixou com aquela sensação de “ainda não é, mas será”.
Nos primeiros dias, andando pelas suas ruas me chamou a atenção suas construções antigas que carregam austeridade e simplicidade. Austeridade diferente da espanhola, que carrega nos seus traços imponência. Países ibéricos diferentes entre si. Devo confessar que fiquei decepcionada. O meu sentido de “pulsante” não era exatamente o que estava observando.
A partir desse ponto, comecei a olhar a cidade com maior abertura para entender o que atrai tanto os brasileiros. Há algo que considero maravilhoso em Lisboa, suas pessoas. Amáveis, gentis, carregam consigo uma inocência que é linda de se ver.
Há uma leveza e alegria. Há um orgulho por “Portugal estar na moda”. Há um interesse que o turismo continue a crescer para trazer mais prosperidade econômica e cultural. Foi a partir de suas pessoas que comecei a me conectar com a cidade. Acredito que em relação aos brasileiros, existe um elo emocional que tem a ver com sua história. O brasileiro gosta de se sentir em casa. Não diria que a aventura e o amor pelo desconhecido seja algo que, comumente, atraia a maioria dos brasileiros.
Só que Lisboa não tem só brasileiros. Franceses, alemães e outras nacionalidades andam pelas suas ruas lotadas de turistas. Fiquei impressionada com a quantidade de jovens com bebês a tira colo. Tudo bem que Lisboa é barata em relação a maioria das cidades europeias. Ainda, oferece comida deliciosa e farta. Fatores relevantes quando se é jovem e se quer viajar. Por outro lado, não resta dúvidas que jovens casais não abrem mão mais de viajar por causa de bebês pequenos. Eles se ajeitam, dividindo as tarefas, se organizando sem que isso vire algo maior. Há uma tranquilidade e naturalidade no lidar com os bebês. Claro, até por estarem nessa rotina de movimentação desde pequenos, as crianças aprendem a se comportar no ambiente público. Vimos poucas cenas, que infelizmente são comuns no Brasil, de criança gritando aos berros, correndo e atrapalhando as pessoas.
A cada cidade que vou, fica cada vez mais claro que viajar se tornou um dos grandes prazeres de nossos tempos. Em Lisboa compreendi que os jovens colocam as viagens no seu orçamento como antes nos colocávamos estudar para subir na carreira. Com orçamento que costuma ser restrito, ainda com filho pequeno, entendo que hoje há uma nova forma de distribuir o dinheiro. Bens de maior durabilidade como imóveis e veículos, devem estar sendo colocados no final de lista.
Para quem busca conhecimento, a história de Portugal ainda falta ser melhor contada. Considero importante compreender a força que o povo lusitano teve para atravessar os oceanos atrás de terras desconhecidas. Visitar o monumento Aos Descobridores, me emocionou. Fiquei um tempo pensando como seria, naquela época, partir. Como seria deixar a família, suas referências. Como seria ver um ser querido partir e ficar. Sem notícias. Refletindo sobre esse partir & ficar, perguntei a amigas brasileiras que acabaram de se instalar em Portugal, por quê o país? A resposta me fez entender mais ainda este país sob a ótica brasileira, e especialmente, devido ao momento particular que vivem os cariocas: busca por segurança. O medo da violência urbana, para quem pode, motiva deixar para trás sua terra. A facilidade de se instalar e a sensação de estar um “pouquinho em casa” são dois outros fatores que ajudam na escolha. Em poucas palavras, busca por aconchego.
Foi após esse delicioso jantar com amigas especiais que minha conexão com a cidade se estabeleceu de vez. Aconchego, amor, acolhimento, segurança e leveza. São valores que sem dúvida, em tempos de transição, todos querem um pouquinho mais. Valores que muitos escolhem para suas últimas décadas de vida.
Seja a fome, seja o medo, seja o desejo de tranquilidade e aconchego; há milênios que o homem migra em busca daquilo que não tem. Lembrei dos meus avós japoneses que migraram sem quase nada saber, para a costa do Peru. Pensei nos muitos imigrantes que chegam hoje no Brasil. Espero que o Brasil esteja sabendo devolver aos novos imigrantes o que os nossos brasileiros vêm buscar por estar terras.
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
2 Comments
Muito bom texto, preciso.
Fico feliz que tenha gostado!!!
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