As mulheres têm aprendido sobre sua sexualidade nas duas últimas décadas mais do que em todo o século anterior, e isso se deve à informação disponível. A informação pode ser correta, errada, parcial, mesmo assim essas possibilidades trazem um lado benéfico quando analisamos que, em termos de conhecimento, o tema precisa ser discutido. E, para ser discutido, o tema precisa estar na mesa do bar, do jantar, no papo com as amigas… Com a discussão, e a reflexão que costuma vir junto, a informação se transforma em conhecimento.
Hoje é mais comum – embora menos do que possamos imaginar – a mulher reivindicar também o seu orgasmo como clímax do encontro sexual. Satisfazer o homem é parte e não objetivo final. O homem tem melhorado em entender esse seu papel no prazer do casal – lentamente, devo confessar. Para a maioria dos homens desse Brasil com fortes traços machistas, um pedido, uma expressão de insatisfação é considerada quase uma afronta à potência sexual e pode gerar uma reação agressiva, ou uma reação de mágoa – que faz as mulheres calarem ou que impede o casal de crescer junto no assunto –, ou uma reação egoica do tipo: as outras gostam! Ai, que preguiça.
Por outro lado, ao mesmo tempo que ganhamos terreno no entendimento do direito ao nosso prazer, também tenho notado nas minhas pesquisas que as mulheres que estão em um relacionamento duradouro costumam ter uma diminuição no seu desejo sexual, a ponto de várias desejarem que o sexo não exista mais.
É difícil definir uma causa – existem os hormônios conectados com a idade, as questões de relacionamento quando as coisas não vão tão bem entre o casal, ou, ainda, os problemas externos que influenciam a rotina e estado anímico de ambos. Por outro lado, entendo que o desejo sexual é uma energia que, como tal, precisa ser nutrida e mantida.
Consigo compreender que, num relacionamento duradouro, a vida com suas responsabilidades e rotinas desviem nossa energia para outras esferas. Mesmo assim, quero trazer hoje um ponto que observo que vem crescendo muito entre os casais: o mundo lá fora tem nos chamado e tomado muito de nosso tempo – especialmente o mundo que observamos e com o qual interagimos via nosso celular ou tablet.
Dificilmente hoje passamos mais de meia hora – sim, disse meia hora para ser boazinha – sem olhar o celular. Sem ler algum texto ou notícia interessante, ou ver o novo clipe de nosso artista favorito, ou bisbilhotar a vida dos nossos amigos e, o que é pior, de personalidades públicas que nem sabem que existimos. Podemos estar juntos na mesa de um restaurante, no sofá ou na cama, e ao mesmo tempo estamos fora dali. Longe de quem amamos e está ao nosso lado. Daí a virar de lado e dormir com um fofo “boa noite” é um pulo. Ou, o que pode ser pior, fazer um sexo rápido, quase mecânico.
Não é fácil romancear no dia a dia, eu sei, mas nosso estado de presença é fundamental para conectar toda a nossa energia com aquele momento e com a nossa relação a dois. Vamos pensar: faz sentido, para além de todas as tarefas e responsabilidades que atrapalham qualquer clima de romance, inserirmos ainda uma terceira pessoa entre nós: o mundo lá fora?
O amor precisa ser cuidado – estamos cansadas de saber –, e talvez seja a hora de entendermos que o nosso desejo sexual também. E cuidar é dar atenção em primeiro lugar. O sexo com prazer exige tempo – especialmente para casais com anos de convivência, porque já deve ter esvanecido o fervor sexual de quando se conheceram – além da queda de hormônios, claro.
Conseguir o controle de ficar fora do “mundo lá fora” com regularidade é um ganho fabuloso para nosso tempo interno – abrindo espaço para leitura, atividades manuais e até de mais cuidado com o corpo; tempo em que, mesmo com alguma atividade, cultivamos nosso mundo interno – e também nos ajuda a colocar a nossa relação no nível de romance suficiente para que o desejo sexual se manifeste aos poucos.
Cheiros, carícias, cuidados com a estética, conversas doces e amorosas ajudam. O desejo sexual no início de uma relação costuma vir da curiosidade, da vontade de explorar os limites do outro. Após anos juntos, os interesses mudam. Descobrir o que, nessa fase da vida a dois, nos excita exige querer colocar nossa atenção nesse assunto. Lembre-se: o sexo é energia e, como tal, precisa da energia da nossa atenção para se nutrir. Que tal começar diminuindo o seu tempo conectada com o mundo lá fora?
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
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