Somos produtos de uma série de influências. O ambiente familiar onde crescemos é o primeiro influenciador que, por sua vez, é influenciado pelo cultural em que está inserido. Crescemos recheados de crenças que nos são colocadas em cada gesto, em cada palavra, em cada atitude.
Seja qual for nossa história somos um especial cruzamento de crenças que representam valores internos que nos guiam. Interagimos com a vida através desses valores e por um bom tempo acreditamos tanto neles que realidade e criação se tornam um só.
A certa altura de nossa vida começamos o processo de individuação. Experiências pessoais, nossa própria personalidade – que para alguns pode vir de vidas regressas – ou algum fato marcante fazem que comecemos a nos abrir para outras visões de mundo além daquela que nos guiava até então.
Tudo que antes nos parecia normal começa a não fazer tanto sentido assim. Questionamos pilares que até então mantinham nosso mundo de forma sólida. Outras escolham se tornam atrativas, outros interesses nos levam para caminhos novos. Nesse momento de início de transição de valores, antes de conseguirmos ter total consciência da mudança, o sentimento de inadequação e, com ela a solidão, se instalam em nós.
Costuma ser um momento confuso, difícil e dolorido. Antigas relações começam a nos questionar e em muitos casos, se afastar. A ironia e provocação, quase sempre gratuitas e desnecessárias, vindas através de indiretas em formato de piadas, nos demostram que nosso distanciamento com a antiga realidade incomoda. Nos sentimos errados, estranhos. ETs no meio de nossos amigos humanos.
Esse é um momento delicado em que alguns andam para trás, apagando a intenção de se individualizar e encontrar seu próprio caminho com medo de ficarem só. Inseguros se estão fazendo o certo. Com isso abafam – mas não conseguem apagar – dentro de si a chama de seu ser que está brotando, com a vontade de se mostrar. E passam parte da vida vivendo uma realidade, uma verdade que não é mais sua.
Outros seja por valentia ou por sentir mais dor em ficar no antigo modelo do que se sentir excluído, continuam com o processo de ser cada vez mais sua essência. Acredito que poucas pessoas saibam para qual direção seguir. Só sabem que devem continuar andando, e assim, encontrando seu rumo e ritmo na medida que vão explorando novos territórios. O encontro só acontece na experiência. Portanto, caminhos errados fazem parte desse momento.
O ganho de quem continua em frente, ao final, é se saber melhor quem se é. De poder expressar melhor seu ser, viver mais abertamente sua essência e, a partir dela, contribuir com a sociedade. Quem sabe, se o sentimento de inadequação te acompanha há algum tempo, não esteja apontando para o início de você se tornar cada vez mais você?
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
2 Comments
Muito bom! Como dizia o mestre Hermógenes, "Deus me livre de ser normal".
Perfeito!
Leave A Comment