Dezembro, a quinze dias do fim do ano, e o relógio parece ter ficado mais acelerado ainda. Existe uma certa paranoia generalizada em que as pessoas vivem como se o mundo fosse acabar. Muitos terão alguns dias de folga e o cansaço do ano – que, diga-se, não foi nada fácil – parece que não é mais suportável. Todos estão agitados. Todos parecem exaustos. Loucos para largar tudo e mergulhar em dias de praia e sol.
Tempo de pensar nos presentes que ainda não foram comprados. Meu marido e eu vamos comprando coisas ao longo do ano. Vemos algo que parece ser a cara da pessoa e compramos. Não importa o mês. Guardamos e damos no Natal ou no aniversário. Mesmo assim, Natal combina com presentes. Creio que todos carregam, no seu imaginário, a mítica imagem da árvore de Natal cheia de presentes, ao seus pés. Eu adoro dar presentes. Vontade de dar uma lembrancinha a todas as pessoas queridas com quem nos relacionamos. Vontade de encontrar amigos queridos para conversar e saber deles. Ficamos na vontade.
Nos últimos anos, comprar uma lembrancinha simpática, bonita e diferente, a preço acessível ficou quase impossível – a menos que você ande, pesquise, busque e use seu tempo para isso. Se nem tomar um café com seu amigo é possível, imagine bater perna e pesquisar. Quando a China entrou na produção de quase tudo, ganhou-se no preço, perdeu-se na originalidade.
Esses dias, uma amiga que amamos e que vive num outro mundo, em Nárnia, me enviou uma mensagem: ela estaria em Guarulhos à espera de um voo internacional por algumas horas; que tal a gente ir até o aeroporto para encontrá-la? Comecei a rir. Ri porque é lindo conhecer uma pessoa que vive num mundo tão doce que tem a inocência de pedir algo assim. Ri porque esse pedido me fez ver como a correria do dia a dia nos distancia. Como o trânsito de São Paulo é capaz de nos fazer abrir mão de encontros que valem a pena.
Anos atrás, eu teria ido. Anos atrás, eu teria pedido. Só que decidir estar no mundo de forma ativa significou interagir mais ainda com ele. E isso toma energia e tempo. Mas estou feliz com a vida que construímos este ano. Com as relações que tecemos. Com as ações que promovemos. A árvore de Natal não ficará cheia de presentes, mas tenho consciência, que este ano trocamos muito amor. Com muitas pessoas. Pessoas queridas.
Ontem à noite, quando olhei para nossa árvore e a vi quase vazia, tive uma sensação de não ter cumprido mais uma tarefa. Sensação de que precisava correr para dar conta de tudo. Pensei que tinha aí mais alguma falha. Fiquei com esse sentimento enquanto via as luzes piscarem e, aos poucos, fui me lembrando das pessoas com quem interagimos ao longo do ano. Pensei nas trocas, pensei nos ganhos, pensei na entrega. Pessoas que iremos carregar no nosso coração. Pessoas que fazem parte do nosso Sistema Solar. Nesse momento me dei conta de que foi um ano intenso de seres humanos.
Sim, a árvore está mais vazia do que costumava estar, mas tudo bem. Fiquei em paz. Afinal, tem presente melhor do que as relações humanas bem vividas? Com toda a sua complexidade e realidade? O que nos faz humanos é a nossa capacidade de amar e nos relacionar. Integralmente. Verdadeiramente. Trocando, nos momento bons e ruins. Adoramos festas, mas sem dúvida somos o ombro amigo nos dias tristes. E recebemos muitos ombros e abraços também. Disso nossa árvore está cheia, bem cheia.
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
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