Acompanhei, bastante apreensiva, devo confessar, o desenrolar do caso dos 12 meninos presos numa caverna com seu treinador na Tailândia. Logo que vi a foto dos meninos sentados calmamente esperando, após nove dias desaparecidos, num local úmido, escuro, frio, com alimento e água para poucos dias a mais, pensei na grande diferença entre o Oriente e o Ocidente.
No oriente, o que eles consideram sagrado é mantido como sagrado. É nutrido através da prática cotidiana a vida toda. É visto como intrínseco ao ser humano e importante para seu desenvolvimento. No ocidente, demos nos últimos séculos mais importância à razão como se tivéssemos que fazer uma escolha. E para isso, ou por conta disso, o sagrado é visto muitas vezes como algo menor. Assim, nossa relação com o sagrado costuma ser funcional: algo com o qual nos conectamos em determinados momentos; especialmente quando precisamos.
Aprendi que o sagrado nos eleva. Nos torna maior ampliando nosso conceito de existência e permanência. Extrapola nossos limites vitais de sobrevivência. Dá sentido a nossa vida. A escolha da razão em contraposição ao sagrado no ocidente, nos ajudou a criar uma sociedade tecnologicamente desenvolvida, avançamos muito como sociedade civilizada. Porém, como sempre acontece quando fazemos escolhas abrindo mão do equilíbrio, hoje somos reféns de nossa própria ambição. A infelicidade que colhemos tem nos levado a nos questionar para quê tudo isso? Qual é o sentido da nossa vida?
Não é à toa que deste lado do planeta estejamos tão interessados em descobrir quem somos, o que queremos, o que nos deixa feliz e qual é o nosso propósito de existência. Olhamos tanto para fora para criar os parâmetros de quem somos, que esquecemos de olhar para dentro. O sagrado nos mantém conectados com nosso interno.
O sagrado nos conecta com razões maiores e intangíveis. Independente da forma com que esse sagrado se pratique a partir da linha espiritual ou religiosa que escolhemos. A conexão com o sagrado se dá a partir da fé, sua maior expressão. Para os críticos das práticas religiosas e espirituais que consideram que a fé obtura nossa visão e compreensão da vida lhes ofereço uma reflexão: para mim, a fé válida é aquela que nos conecta com aquilo que já sabemos. Por isso se torna forte. Esse reconhecimento consciente do que já sabemos dentro de nós, nosso coração, no nosso Sentir, como eu costumo chamar, nos fortalece e nos sustenta. Nos tranquiliza. Basta observar o comportamento dos meninos e do técnico na caverna.
Quando a fé não é conectada com o que já sabemos, o resultado é o oposto: ela nos intranquiliza, nos culpabiliza. Nos enfraquece e nos torna dependentes. Por isso, essa outra prática de “fé” exige do convencimento. Porque não é natural. Ela não é reconhecida por nosso interno.
Sinceramente, após a prática contínua de mais de 25 anos de meditação, que eu chamo de interiorização; estou convencida que sempre sabemos reconhecer a diferença entre a fé e a cegueira espiritual. É só ouvir a voz do coração e sentir. Podemos não ouvir com clareza, especialmente se estivermos num momento confuso. Mas que a voz está lá… ah! ela está.
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
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