Tenho pesquisado, estudado e refletido sobre a desigualdade e a injustiça. Ambas nos cercam e fazem parte da nossa forma de ser. Difícil alguém que não tenha sido injusto ou tenha se aproveitado da desigualdade para se dar bem. Difícil quem não tenha sofrido por causa de uma ou de ambas.
A injustiça que a desigualdade impõe causa raiva. A raiva causa revolta, indignação e, às vezes, desejo de vingança. Energias que nos consomem. Somos nós que perdemos parte de nossa vida grudados ao passado por conta desses sentimentos. Eu sei que não é fácil superar isso. A injustiça cria marcas profundas. Mágoas, dores, crenças limitantes. Doenças. Como lidar com tudo isso?
Quando essas emoções tóxicas ficam dentro de nós, permitimos que a pessoa, sistema ou grupo social continue manipulando nossa vida. É como um fio condutor ao qual ficamos presos. A dor nos mantém unidos a quem nos manipula. Perdemos a liberdade de criar novas experiências.
Toda vez que me sinto injustiçada e a raiva entra dentro de mim, me lembro disso. Me lembro do poder que estou dando ao autor da injustiça sobre minha vida. Preciso manter esse poder sobre mim? Não. Realmente não.
Mesmo assim, sei que não é fácil. Curar feridas emocionais nunca é. Mas devemos tentar, se quisermos a liberdade de Ser. Nada é tão libertador quanto perdoar e deixar o passado no seu devido lugar. Acreditem. Que tal iniciar o ano com isso feito? Ou, pelo menos, colocar como meta em 2020.
Há várias formas de superar as dores da injustiça. Antes vou trazer uma que parece perdoar, mas não é: ignorar. Pelo simples fato de que ignorar não é perdoar. Mantemos vivos o fato, a dor, as emoções e os sentimentos dentro de nós. Mesmo criando uma barreira. A mesma barreira que nos afasta é a mesma que retém a dor e mágoa em nós.
Sempre que é difícil para mim perdoar me lembro de Nelson Mandela. Nunca vivi nada próximo às dores dele. Mesmo tendo passado 27 anos da sua vida de jovem adulto na prisão, entendeu que ao sair, promover e incentivar mais raiva – ainda que justificada – não iria, em momento algum, ajudar a nação e a liberdade pela qual tanto lutou. Infelizmente, atitude e caráter que estão tão distantes dos nossos líderes políticos, que se alimentam cada vez mais da polarização que ajudam a criar.
Precisamos colocar um ponto final para recomeçar. Todos cometemos erros. Seguir adiante é mais digno e próspero. Temos que lembrar que, até para lutar por mais justiça, precisamos de lucidez. E ela vem mais forte quando perdoamos. Quando nosso coração está em paz.
Por conta disso, o meu caminho em direção ao perdão passa por compreender o contexto histórico e a matriz de crenças que sustentam a visão de mundo da pessoa, grupo ou sistema. Entender que todos somos movidos pelo ambiente é fundamental. Ajuda a perdoar, mas também não desculpa quem insiste no erro.
Em tempos de transição de valores, cabe ao ser humano escolher quais crenças quer sustentar. Se para se sentir com poder e vencedor a escolha é pela manutenção da injustiça, então, eu não preciso perdoar. Só lamentar. Estamos em lados oposto do espectro.
2020 marca o início de uma nova década. Vejam que propício iniciarmos o ano livres – ou pelo menos com o propósito de ficarmos livres – para Ser, amar, viver, sonhar e expandir. Vamos?
Nany Bilate é pensadora intuitiva e pesquisadora. Seus estudos e textos são focados na transição de valores e crenças da nossa sociedade. E sua interferência nas identidades feminina e masculina contemporâneas.
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