Quando penso em lucidez e fantasia, nosso tema da semana, me lembro de uma experiência que tive e que foi muito diferente. Na minha busca por auto conhecimento já fiz de tudo. Certa vez fui parar num curso, vivência, workshop ou seja lá o nome que se dá aquilo, lá em Florianópolis. Foi uma semana fora do mundo real, com um grupo isolado, numa pousada bem maluca. Nunca sabíamos qual seria o próximo passo.
Num dos dias, logo cedo, fomos informados que deveríamos passar as primeiras 6 horas do dia usando um óculos de lentes pretas. Não poderíamos tira-los por nada e não importava se estávamos dentro ou fora da pousada. No início ficamos super animados porque, pela primeira vez depois de dias, poderíamos quebrar o voto de silêncio e conversar entre si. Depois de alguns minutos de empolgação fomos pegos por um certo mau humor. A maioria das pessoas do grupo, eu inclusive, começamos a nos tornar ácidos, discutíamos por qualquer coisa. Fechou o pau. Em menos de duas horas, o silêncio voltou a reinar e agora não mais porque éramos obrigados e sim, porque não tínhamos disposição para interagirmos.
Depois das 6 longas horas descobrimos que trocaríamos os óculos escuros por óculos cor de rosa. De novo a novidade entusiasmou o grupo, pois a grande maioria, nunca tinha experimentado ver o mundo, literalmente, de lentes rosas. Também não foi preciso mais do que alguns minutos para tudo tornar-se chato novamente. Como já tínhamos entendido a “brincadeira” começamos a forçar uma certa “meiguice” além da conta uns com os outros. Aquela doçura toda foi ficando tão pegajosa e chata que, novamente, em menos de duas horas estávamos todos no mais absoluto silêncio.
Finalmente, ao cair da tarde, pudemos voltar a enxergar o mundo com nossos próprios olhos. Foi espantoso. Ninguém forçou empolgação. Estávamos tão admirados com as cores da natureza, a beleza de um entardecer de inverno com sol, naquela magia que a ilha realmente tem que mais uma vez o silêncio foi o companheiro de cada um de nós. Porém agora o sentimento era de cada um e não coletivo. Tudo se transformou em contemplação e reflexão.
Sempre penso neste exercício. Para mim, o mundo sem filtro é o mundo do equilíbrio entre a lucidez e a fantasia. Era onde deveríamos estar diariamente, mas como humanos que somos, é impossível não deixar se abater por filtros que passam por nós no dia a dia e nas fases da vida.
Um dia contei esta história para um amigo que depois me deu de presente um óculos de lentes cor de rosa. Dias atrás encontrei este óculos numa das minhas gavetas de trabalho e descobri que a lente de um dos lados havia quebrado. Coloquei os óculos por brincadeira e experimentei uma nova sensação: ver sem filtro e cor de rosa ao mesmo tempo. Foi muito simbólico, mas ainda não sei o que isso quer dizer.
Ah…o nome do tal curso de Floripa era Confiando e Celebrando. Eu adoro o nome. Acho que foi por isso que decidi embarcar nele. Confesso que foi mais meu lado fantasia do que meu lado lucidez que determinou este passo. E foi bom.
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