Ouvi esta história tempos atrás, mas inicialmente não havia percebido que estava diante de um movimento importante, consequência dos novos tempos. Só depois que falamos sobre as senhorinhas modernas é que vi que se tratava de um novo tipo de situação, mais comum agora do que em outros tempos. 


Um homem com 60 e poucos anos, foi executivo de uma multinacional sua vida toda. Morou em diversos países, aguentou todo o tipo de pressão, passou por todas as crises, dedicou uma vida toda à corporação. No fim do ano passado, já com idade suficiente para se aposentar, decidiu fazer isso. Ainda se sente bem e em forma para continuar trabalhando, mas resolveu que gostaria de gostaria de tentar algo novo. Apaixonado por sua casa na Serra da Mantiqueira, resolveu abrir um bar na região que é bastante turística. Nada de trabalhar demais e nenhuma pretensão de ganhar dinheiro, mas com muita vontade de compartilhar histórias e estar num lugar que ele gosta. Os filhos já são adultos e seguem o seu caminho, mas a esposa, próximo aos 60 anos ainda trabalha – também como executiva em uma multinacional. Ela nem sonha em se aposentar, adora estar no meio da agitação e suas constantes viagens internacionais a trabalho. Sempre acompanhou o marido quando foi expatriado, mas mesmo no exterior e com os filhos pequenos, nunca deixou de trabalhar. Ela não quer se mudar de São Paulo, muito menos ter um bar na Serra. Gosta da casa de campo, mas prefere passar os finais de semana lá e só. Decidiram, inicialmente, que o bar funcionaria de quinta a domingo. O marido vai antes para lá e ela o encontra na sexta à noite ou sábado. Mas com a vida corrida e sem vontade de dirigir por horas sozinha, acaba sempre dando um jeitinho de escapar. Vão vivendo, mas até quando? 

Não tenho muita intimidade com esse casal, mas usei da pouco cara de pau que tenho para perguntar o que ela imagina que irá acontecer com eles. Ela, sabiamente, me respondeu que não tem mais tempo para ficar pensando “e se isso ou e se aquilo”. Na visão dela, durante anos, o marido teve apenas uma preocupação na vida: a empresa em que trabalhava. Ela, por sua vez, se virava em profissional, mãe, esposa, mulher…aquela história toda que a gente conhece bem. Ao me falar isso, senti que ela não estava se queixando da vida que levou com o marido e nem estava dizendo ele foi um pai ou companheiro ausente. Mas estava sendo sincera ao observar os fatos como eles aconteceram: para ele poder se dedicar com energia ao se trabalho, quem fazia o entorno funcionar era ela. Agora que os filhos cresceram e o marido já não precisa de tanta atenção, o que a mova é a sua carreira. O que será dela se abriu mão disso? Ela acredita que eles encontrarão o equilíbrio como já aconteceu tantas outras vezes na vida do casal. Mas resposta do que será o futuro deles juntos, ela não sabe dizer.

Conheci um outro casal por volta dos 60 anos também, num churrasco na casa de um amigo. Numa mesa de conversas descontraídas num sábado à tarde, eles contaram que haviam decidido morar em casas separadas agora que a filha caçula tinha ido morar fora. Chegaram à conclusão que tinham cada um as suas manias e que seria melhor assim para o casal. Combinaram que não deixariam de se ver pelos menos 3 vezes por semana e que viajariam juntos – hábito que unia os dois. Pareciam felizes com a decisão e não aparentava distanciamento. Mas ainda era uma grande novidade.

Com meu pai e minha mãe, bem mais velhos e desgastados do que as histórias acima, aconteceu o contrário: depois de uma vida toda de desencontros, agora parecem sentir necessidade da presença um do outro. No início do ano resolvi levar minha mãe para a sua casa na praia, pois meu pai precisa de cuidados especiais 24 horas por dia e sair de casa é impossível para ele. Ela ainda, forte e vigorosa, fica presa a esta situação e já não ia para a praia há tempos. Achei que estava fazendo uma coisa boa, pelo menos para ela, mas dois dias depois descobri que não. Ela fica ansiosa, agitada, perdida longe dele. Voltamos para casa antes do combinado.

Que os dois velhinhos fiquem juntos e em paz. E que os moderninhos de 60 e poucos an abram cada vez mais a cabeça para ajeitar suas vidas e encontrem juntos (ou não) o que faz bem para eles. Coisas de um novo mundo.